Aluno exemplar. Esta é a melhor definição para Leonor Marques de Almeida, de 63 anos, que entra para o Livro dos Recordes por obter 100% de presença no curso de Direito da Faculdade Jaguariaíva (FAJAR – PR), iniciado em 2005. Este ano, Leonor comemora duas grandes conquistas: o diploma e o recorde brasileiro.Entrar para o RankBrasil é motivo de orgulho para Leonor. “Sou uma pessoa humilde, mas já comecei a me sentir exibido: sou o primeiro a registrar tamanha façanha de cinco anos de luta, num país de 510 anos”, diz. Ele pretende ver um concorrente para o recorde nem que demore 50 anos. “Onde passa um boi passa uma boiada”, brinca.
Obter 100% de presença em um curso de cinco anos exige muito esforço. “A vontade de ir ou não está no controle do ser humano. Difícil foi dominar o frio, o calor, a chuva e principalmente o cansaço”, revela. Durante a faculdade, além de estudar, Leonor tinha dois períodos em sala de aula, como professor.De acordo com o recordista, ter 100% de frequência não é apenas uma questão de adquirir todo o conhecimento repassado. “É uma mania de responsabilidade e respeito com quem ensina”. Outros cursos que ele se orgulha da participação são de preparatório para o matrimônio, com 32 certificados e o de Teologia, com 300 horas, em três anos.
Incentivo
Dois principais motivos levaram Leonor à faculdade. O primeiro é por saber que sua aposentadoria estava próxima e por não querer ficar sem fazer nada. “Acredito que cada ser humano tem um fim social. Decidi fazer Direito por ser um meio de investigar as desigualdades e a lei é o instrumento para garantir as diferenças entre as pessoas”, explica.Conforme ele, o segundo motivo foi à proximidade da faculdade: “A FAJAR fica na mesma avenida que moro e no início, funcionava na mesma escola em que eu trabalhava, cerca de quatrocentos metros da minha casa”.
Dificuldade
A questão financeira foi a maior dificuldade para a conclusão do curso, segundo Leonor. Nos dois primeiros anos, o recordista pagou valor integral. “Percebendo que não conseguiria pagar as mensalidades, conversei com o diretor geral, professor Augustinho Ludwig. Disse que precisava de uma bolsa para continuar os estudos”, conta.“Consegui uma autorização para pagar somente 60% do valor da mensalidade. Só tive o desconto por não ter nenhuma falta”, lembra. “Isto me deu condições de continuar”, diz o recordista, agradecido.
Colegas
O convívio com os colegas de classe foi muito interessante, segundo Leonor. “Eu era o mais idoso da turma e o segundo da faculdade. Havia uma professora mais velha do que eu e os outros todos com menos de 35 anos”, diz. “Por várias vezes eles escutaram minhas histórias, quando inerente à matéria”, lembra.Leonor só tinha problemas com os matadores de aulas. “Eles brigavam comigo quando queriam matar aula e eu não faltava. Com 100% de ausência ninguém teria prejuízo de matéria, porém todos receberiam a falta”, diz. De acordo com ele, até alguns professores não gostavam da sua atitude.
“Para participar dos churrasquinhos da turma, primeiro os professores tinham que me dar frequência em sala de aula. Depois, eu mesmo os levava para as festas”. O mais engraçado é que nas festas eu bebia e um colega que não bebia (Dione) levava meu carro e eu até minha casa.Após a merecida graduação em Direito, Leonor pretende fazer um concurso de nível superior, relacionado ao poder judiciário. “Um dia quero chegar à magistratura”, comenta.
Novo visual
Quando Leonor entrou na faculdade de Direito, já fazia muito tempo que não cortava a barba. “Falei que só cortaria depois da conclusão do curso”, diz. As colegas de turma do recordista sugeriram que ele deixasse de cortar os cabelos também.
“Aprovei a ideia. Após um ano, tornei-me o bebê da minha esposa. Era ela que me penteava depois do banho”. Isto durou até 11 de fevereiro deste ano, no dia da formatura de Leonor.
Agradecimento
Leonor destaca o apoio da família durante seu curso. “Sou bom em redação, porém, péssimo digitador: minhas filhas e nora que digitaram meus trabalhos, inclusive o meu Trabalho de Conclusão de Curso, que teve o título Assistência Social”.
Decisão inesperada
Após receber o diploma do curso de Teologia, em 2004, durante almoço em família, Leonor olhou para sua esposa Maria Cândida e disse: “Daqui a quinze dias é o vestibular da FAJAR, vou fazer e escolher Direito”. Segundo ele, a esposa desaprovou a ideia, “porque ela queria sossegar depois que a gente se aposentasse”.Foi então que ele lançou uma aposta: “Se eu ficar até o décimo segundo lugar, vou cursar a faculdade. Se ficar do décimo terceiro em diante, vou desistir”. E lá foi Leonor fazer o vestibular, mesmo sem ter estudado. Ele conquistou o sexto lugar, com a nota 9,8 na redação, a maior entre os 1.070 alunos que realizaram o vestibular.
Vestibular para medicina
Em 1977, Leonor prestou seu primeiro vestibular. Foi na Universidade Estadual de Londrina (UEL – PR), para Medicina. “Entre os milhares de concorrentes, para noventa vagas, fiquei esperando a desistência de dez pessoas. Na mesma semana fui chamado, mas acabei desistindo por não ter condições de deixar de trabalhar, para estudar em período integral”, conta. “Queria muito ser médico. Fiquei de coração partido”, diz.
Recordista revela sua história
Ao conquistar um recorde brasileiro, por obter 100% de presença no curso de Direito, Leonor lembra as dificuldades que enfrentou na vida. Aos seis anos, teve que encarar o primeiro grande desafio. Ele perdeu o olho direito, ao brincar com estilingue.Leonor nasceu numa família humilde. Morava com os pais, o avô materno e sete irmãos. A casa era um galpão coberto de sapé, erguida de pau a pique. Não existiam tábuas nem tijolos. A luz era lampião a querosene. “Meu pai era analfabeto, mas minha mãe começou a me ensinar a ler e a escrever nos meus sete anos”, destaca.
Em função do problema de visão, aos oito anos, ele foi morar com uma tia avó, em Faxinal – PR. Ao terminar o quarto ano do primário, o recordista ficou dez anos sem estudar: “A cidade era pequena e só havia o primário”.Ainda em Faxinal, Leonor retomou os estudos com a fundação do Colégio São Domingos. Para entrar no colégio particular, ele teve que fazer um cursinho denominado admissão. “Era tão categórico que parecia um vestibular. Passei em primeiro lugar”, conta.
Morando na zona rural, a três quilômetros da cidade, Leonor concluiu os quatro anos de curso Técnico em Contabilidade, com apenas seis faltas injustificadas. Simultaneamente, fez curso de Magistério. “Comecei dando aulas para a 1º a 4º séries, padrão que este ano me aposento”, revela.Por várias vezes, Leonor deixou o magistério para trabalhar informalmente, o que atrasou sua aposentadoria. Ele se casou em 1972 e teve três filhas e um filho. “A vida era difícil: em dezessete anos nos mudamos vinte e três vezes. Em 1987 aconteceu a última mudança, quando fomos morar em Jaguariaíva”.
Leonor foi o primeiro morador da Avenida Jaguariaíva: “Vi nascer à escola Júlio de Mesquita Filho e na mesma avenida, a Igreja Nossa Senhora das Graças. Nesta igreja, por várias vezes fui vice-presidente, tomando conta da obra, desde a fundação das torres, até a chegada do primeiro pároco”.Redação: Fátima Pires